Direito para startups não é uma nova área específica, como seria, por exemplo, o direito trabalhista ou direito de empresarial. É um conjunto de normas gerais que agregam e fazem parte das estratégias empresariais e de crescimento, sendo a mentalidade do advogado o maior desafio neste nicho.
O intuito deste artigo é demonstrar para você, advogado ou advogada, que não existe segredo para a atuação nessa área, mas há sim modos de agir, formas de trabalhar e lidar com estes empreendedores, muitas vezes a frente de seu tempo.
Com a base aqui exposta, você terá condições de entender um pouco mais sobre esse universo e saber se quer encarar esse desafio que, no mínimo, faz com que advogados, até então sempre foram focados em questões técnicas, cresçam muito e aprendam o que é empreender, hajam com empatia e façam a diferença na sociedade ao impactar esse nicho que pode alterar o curso de muitas pessoas.
O que é uma startup?
No final do século XX e início do XXI, as ditas startups começaram a se destacar. Mas afinal, o que é uma startup? O conceito atual, nos termos da Lei da Liberdade Econômica, startup é:
Vejam que, para ser caracterizada como startup, a empresa não precisa ser, necessariamente, de base tecnológica. São modelos de negócios específicos, com a criação de serviços ou produtos “novos” e, os mais radicais, chamados de disruptivos.
Além disso, outra característica importante para conceituar a startup é a “incerteza”, pelo fato de que são inovações que, ao contrário do mercado tradicional, não se sabe qual será a aceitação da sociedade no geral.
O que é o direito para startups?
O direito para startups, muito em voga hoje, é reflexo do crescimento e evolução da internet, que ainda passa por diversas alterações estruturais e legais, sendo, essa própria “área”, repleta de incertezas.
Antes de qualquer coisa, é importante frisar que startup é uma empresa como qualquer outra. Geralmente em estágio inicial de desenvolvimento, ela necessita estar adequada à legislação e regras empresariais, havendo deveres legais envolvidos, sendo preciso que um advogado regularize essas relações e forneça segurança para as atuações.
Portanto, o direito para startups é um conjunto de leis e regras, que trabalham em conjunto para dar suporte a este nicho peculiar e com o dinamismo que a advocacia tradicional, muitas vezes, não está apta para acompanhar.
O advogado que atuará diretamente com essas empresas, ainda que seja especializado em determinada área do direito, deverá ter um conhecimento amplo diversos ramos que destacaremos neste artigo, eis que eles estão intimamente ligados a praticamente todos os passos de uma startup que, como já mencionado, são empresas muito dinâmicas e peculiares.
Como é a atuação do advogado no direito para startups?
O advogado que quiser ingressar neste mercado deverá estar atento a uma gama enorme de regras, normas, regulações e ramos do direito, pois há uma ligação forte entre muitas áreas.
Outro ponto é gostar de desafios e, sem clichês, querer sair da zona de conforto, pois a atuação com o direito para startups é uma ótima forma de crescimento pessoal e profissional, fazendo aflorar o empreendedor que existe em você.
Empreender é um estado de espírito e, em uma startup, isso fica muito mais evidente, pois seus fundadores – e até colaboradores – sabem que estão vivendo em uma incerteza sobre o futuro do negócio, devendo o advogado estar atento às inovações, para aconselhar e acompanhar estes parceiros.
É normal que profissionais do direito tenham um pouco de aversão ao risco. Todavia, nesta área de atuação não há margem para certezas e nem base legal para todas as questões travadas no dia a dia de uma startup, principalmente porque as inovações são constantes e não há possibilidade de eliminar os riscos, somente mitigá-los.
É diferentemente da advocacia tradicional, em que o advogado, quando se defronta com qualquer questionamento, apenas vai aos manuais, doutrinas, jurisprudência e legislação.
No caso das startups, ele precisará de todo o conhecimento retro citado, mas também terá que ter base sobre tecnologia, análise – ainda que mínima – sobre o mercado daquela startup, sobre os possíveis avanços daquele ramo e, sobretudo, muita empatia para se colocar no lugar daquele fundador que, muitas vezes, não faz retirada de nenhum real da empresa e sobrevive no limite apenas para manter o sonho.
E por que isso é bom? Simples. Pelo fato de conseguir agregar um valor para sociedade que, de fato, poderá impactar a economia local e até mesmo do país. Uma startup que consegue obter sucesso poderá fazer com que muito capital gire ao seu redor, gerando empregos e melhoria na vida de muita família.
No entanto, estes desafios não são fáceis. O advogado que escolhe esse nicho precisa ser muito resiliente, saber ouvir muitos “nãos” e mesmo assim continuar querendo contribuir ao ecossistema sem pensar no retorno financeiro imediato.
Sim, este mundo não é cheio de piscinas de bolinhas, como o pessoal pensa que é. É cansativo, estressante (como geralmente é a profissão), mas muito compensador, principalmente para advogados e escritórios que possuem propósitos firmes no sentido de fomentar o empreendedorismo.
Desafios na atuação em direito para startups
As principais barreiras são as regulações. Os setores que mais sofrem com isso são os da saúde e financeiro, mas também não podemos deixar de destacar a área do agronegócio, tendo em vista que alguns produtos, criados com base tecnológica e biológica, necessitam de autorização do Ministério da Agricultura para serem liberados para venda.
Diante disso, o advogado que atua nessa área, ao atender um possível cliente, precisa estar atento às regras regulatórias do setor que, como tudo neste nicho, podem ser alteradas sem aviso prévio e rapidamente.
Outro ponto que é um grande desafio são as barreiras de prioridade dos empreendedores. Em geral, eles são apaixonados pela ideia e se preocupam muito com os aspectos técnicos, sendo que as questões jurídicas passam a ser ocasionais. Os fundadores/sócios, sabem das exigências legais, mas não agem de imediato para saná-las ou prevenir eventuais riscos.
Então, neste quesito, o profissional jurídico precisa educar esses empreendedores, no sentido de que eles entendam a necessidade de criação de estratégias jurídicas para a saúde da empresa, afastando a crença de que os advogados não entendem de seus negócios e necessidades.
Não menos importante é o seguinte desafio: os negócios. Advogados com a mentalidade mais técnica nunca viram a necessidade de aprender sobre negócios, pois que foram educados apenas para trabalhar partes técnicas e estratégias processuais. Para atuar com startups, o profissional precisa entender de negócios, gestão e pessoas.
E vejam: entender de negócios e pessoas não é simples. Livros dão informações básicas sobre como fazer negócios e gerir pessoas, mas apenas o dia-a-dia e a entrega de fato, fazem com que um advogado saiba falar a mesma língua que empreendedores deste setor.
Conjunto de normas que norteiam o direito para startups
Como já destacado, o direito para startups é um conjunto de normas jurídicas, regulamentações e burocracias. Portanto, não há uma legislação específica. No entanto, dentre essas normas, se destacam as seguintes áreas do direito:
Direito empresarial e societário
O direito empresarial responsável pela formalização da startup, criação de acordos de sócios, com regras, metas e funções dos fundadores, criação de contrato social com as peculiaridades daquela sociedade.
Além disso, também deve sempre pensar na possibilidade de crescimento rápido e investimento externo, devendo criar, para isso, uma base contratual sólida prevendo a possibilidade de novos sócios, compra e venda de cotas, bem como as regras de diluição das cotas existentes.
Direito civil
Presente em quase todo lugar, o direito civil é extremamente necessário para a criação de contratos com fornecedores, parceiros, locações, dentre outras questões peculiares de cada startup.
Direito do consumidor
Muito importante no cenário das startups, tendo em vista a ideia de sempre escalar o negócio. Neste ponto, é imprescindível que o profissional jurídico conheça as normas consumeristas, para que a empresa não sofra com possíveis ações judiciais e indenizações enormes.
Direito trabalhista
Startups crescem e, algumas, muito rápido. Com isto, muitas passam a contratar muitos colaboradores e, não raro, sequer fazem os devidos registros ou pagam adequadamente.
Além disso, muitos fazem “parcerias”, que em grande parte são funcionários disfarçados de freelancers. Assim, um advogado antenado poderá indicar formas de contratação, ou contratação de ferramentas tecnológicas, para ajudar neste crescimento e diminuir riscos de passivo trabalhista com acúmulo ou desvio de funções.
Direito tributário
Muitas vezes, startups crescem tanto que, ao expandir para outras cidades e estados, se deparam com legislações tributárias específicas. A falta de um planejamento tributário pode fazer com que taxas e impostos sejam pagos em excesso, diminuindo a margem de lucro.
Por outro lado, a ausência destes pagamentos pode fazer com que multas sejam geradas e prejuízos financeiros enormes surjam de surpresa.
Lei Geral de Proteção de Dados
Ainda sequer em vigência no país, mas é de extrema preocupação. Isto porque muitas startups são de base tecnológica, contando com quantidades enormes de dados de pessoas físicas e jurídicas.
A LGPD traz regras de controle desses dados, sendo muito importante a atuação direta de um advogado na implementação de um programa eficaz dos controles, tendo em vista o risco de multas e outras penalidades.
Tudo isso é a base. É inquestionável que cada profissional tem a sua especialização, mas não é aceitável que, ao trabalhar com startups, o advogado ignore completamente algum destas áreas, pois as estratégias devem ser vistas a longo prazo e com visão legal ampla.
Curso de direito para startups
Tornou-se comum algumas entidades oferecerem cursos de direito para startups, tendo em vista que este mercado está em evidência. E, como já mencionado anteriormente, é necessário ter noção de que o direito para startups não é um ramo autônomo e muito menos uma matéria simples, como aquelas normalmente ensinadas nas grades curriculares.
O profissional que tiver conhecimento em direito empresarial conseguirá atuar para startups, mas entendo que os cursos podem agregar muito para o aprendizado e o início de atuação com este nicho, pois existem muitas dicas sobre as peculiaridades, contratos e dinamismo do setor, evitando que o advogado chegue muito perdido sobre como é realmente este mundo.
Dito isto, tem-se que, ao analisar os possíveis cursos, observar o histórico dos professores e facilitadores para constatar se eles realmente trabalham com este nicho e não estão somente surfando na onda, sem ter conhecimento de causa ou ter aplicado aqui no dia a dia.
Um dos cursos melhores conceituados é o do curso de Direito para Startups do Insper, de curta duração, mas com professores que realmente entendem sobre o tema.
A FGV também é bastante aconselhável e possui cursos específicos na área, contando com professores também muito bem colocados neste mercado.
Além deles, há um curso denominado Direito Aplicado Para Startups, com o professor Dr. Rodrigo Marques, que possui uma vasta experiência neste ramo, atuante no direito digital e para startups, com uma boa didática para o meio on-line. A divulgação dos cursos dele são feitas pelo instagram (@profrodrigomarques). Fique atento, pois pode ser uma boa porta de entrada. 🙂
Uma dica final que dou, além dos cursos, é para que você viva neste ecossistema. Frequente incubadoras e aceleradoras, vá a eventos, faça contatos e realmente aprenda sobre este universo. Além de abrir muito a mente para aplicar inovações na sua rotina, você irá entender este dinamismo que muito destacamos no artigo.
Conclusão
O direito para startups é um nicho razoavelmente novo. Há cerca de 2 anos, passou a se tornar muito explorado, o que é um enorme risco para o ecossistema, pois a possibilidade de exploração por profissionais que não se prepararam para atender este público é grande.
O ecossistema das startups precisa de bons advogados com o mínimo de conhecimento apurado sobre como estes empreendedores agem e trabalham.
O conhecimento técnico, por si só, não basta. Para falar a verdade, os empreendedores não buscam isso, mas sim que os seus parceiros jurídicos trabalhem como eles: dinâmicos, audaciosos, com propósito e sonhe grande.
Os desafios são enormes, mas é gratificante demais poder ver esse ecossistema se desenvolvendo com sustentabilidade e lembrando da importância de contar com profissionais do direito.